Especialistas Prevêem Crescimento Económico, Mas Alertam Para Desafios na Retoma do Projecto Mozambique LNG • Diário Económico

Na semana passada, a notícia que dominou as manchetes dos jornais nacionais e internacionais teve que ver com o facto de o Conselho de Administração do Banco de Exportação e Importação dos Estados Unidos (EXIM) ter aprovado um financiamento de quase 5 mil milhões de dólares (aproximadamente 320 mil milhões de meticais) para o Projecto Mozambique LNG, operado pela TotalEnergies. A decisão marca um momento significativo na recuperação do projecto, suspenso desde 2021 devido à escalada da violência armada em Cabo Delgado. Com a aprovação do financiamento, surge uma oportunidade para retomar as operações, que são cruciais para o desenvolvimento da economia nacional.

Para perceber melhor o impacto deste financiamento na economia nacional e nos esforços do País em mitigar a violência terrorista que se verifica na região norte, o DE ouviu alguns especialistas que defendem que o financiamento permitirá a retoma do projecto, permitindo a reanimação da economia que já se mostra débil.

De acordo com o economista Clésio Foia, o investimento do EXIM Bank representa um marco importante na recuperação do projecto e terá um impacto positivo no curto e longo prazo para o País. “Apesar de ser um passo significativo, para que Moçambique comece a produzir gás natural liquefeito na Área 1, ainda existem vários desafios a serem superados”, afirmou Foia.

Necessidade de garantir segurança em Cabo Delgado

A fonte explicou que a principal preocupação continua a ser a segurança na província de Cabo Delgado. “A TotalEnergies, operadora do projecto, exige garantias de segurança sustentáveis para retomar as suas actividades. A violência persistente na região tem sido um obstáculo significativo para a exploração do gás, com o reforço das Forças de Defesa, apoio militar de Ruanda e da Comunidade de Desenvolvimento da África Austral (SADC), e a criação de mecanismos de inclusão das comunidades locais ainda a constituírem questões fundamentais para garantir estabilidade na área”, disse.

Economista defende a garantia da segurança em Cabo Delgado como sendo um dos grandes desadfios para a retoma das actividades

Outro ponto levantado por Foia diz respeito à construção de infra-estruturas críticas. A continuidade das operações exige a construção de instalações que garantam a circulação segura de equipamentos e pessoal técnico, além da reorganização das empresas contratadas, muitas das quais desmobilizaram recursos durante a suspensão das actividades. “A retoma do projecto exigirá um esforço substancial para reacender os contratos, reunir técnicos especializados e garantir o fornecimento logístico necessário para a aceleração das actividades”, acrescentou.

Impactos macroeconómicos e oportunidades de emprego

Em termos macroeconómicos, o impacto do financiamento do EXIM será significativo. No curto prazo, espera-se que o projecto impulsione sectores como a construção civil, engenharia e serviços logísticos, com a criação de cerca de cinco mil postos de trabalho directos e indirectos, especialmente em Cabo Delgado. No longo prazo, com a produção e exportação de gás, o projecto poderá aumentar as receitas fiscais e cambiais do País, contribuir para a estabilidade do metical, reduzir o défice orçamental e fortalecer as reservas cambiais. Além disso, espera-se que a construção de infra-estruturas essenciais abra portas para o desenvolvimento de outros sectores económicos, como a agricultura comercial, a indústria manufatcureira e o turismo.

No entanto, explica Foia, o projecto também apresenta riscos económicos. “A persistente instabilidade em Cabo Delgado pode atrasar o processo das operações e aumentar os custos de produção. Flutuações nos preços internacionais do gás podem afectar a viabilidade financeira do investimento. Outro desafio é a possibilidade de valorização excessiva do metical com a entrada de divisas, o que poderia prejudicar a competitividade de outros sectores económicos – um fenómeno conhecido como ‘Doença Holandesa’”, elucidou.

A importância da preservação dos direitos humanos

Wilker Dias, director executivo da Organização Não-Governamental, plataforma Decide, mestre em Ciência Política e Relações Internacionais, docente na Universidade Alberto Chipande e consultor para assuntos políticos, securitários e humanitários, aborda de forma crítica a situação da retoma do projecto Mozambique LNG. Para Dias, a questão da segurança e a preservação dos direitos humanos são factores determinantes para o sucesso do projecto e para que os benefícios da exploração de recursos naturais se distribuam de forma equitativa e sustentável.

“Para garantir que o projecto seja bem-sucedido, é imprescindível que as empresas envolvidas considerem a situação de direitos humanos e ambientais nas suas operações”, afirmou o académico, sublinhando: “Isso não só reduzirá os riscos de instabilidade na região, mas também permitirá que as comunidades locais beneficiem dos recursos advindos do projecto”.

Segundo o especialista, sem essa consciencialização por parte dos actores internacionais, o projecto poderá não ser bem recebido pelas comunidades moçambicanas, principalmente em Cabo Delgado, onde a violação de direitos humanos tem sido um dos catalisadores da violência e do conflito armado. Wilker Dias alertou que a segurança continua a ser o maior obstáculo para a retoma do projecto. “Sabemos que a segurança é um dos principais factores que impedem a concretização de grandes investimentos na região. Para que o Mozambique LNG avance de forma sólida, é fundamental que a situação de segurança em Cabo Delgado seja resolvida de forma definitiva”, sublinhou.

Académico entende que é urgente garantir a preservação dos direitos humanos

O papel do Governo e a inclusão das comunidades locais

Para o académico, o Governo tem uma grande responsabilidade nesta questão, e deve continuar a trabalhar em estreita colaboração com as comunidades locais, garantindo que estas não sejam afectadas negativamente pelo desenvolvimento do projecto. Dias enfatiza a importância de envolver as populações locais em todo o processo, não apenas como testemunhas, mas como agentes activos do desenvolvimento, com acesso aos benefícios do projecto.

Outro ponto importante que Dias destaca é a necessidade de políticas claras para garantir que os recursos advindos da exploração do gás sejam utilizados de forma eficaz e sustentável. “Os recursos que advêm da exploração do gás podem ser extremamente importantes para o desenvolvimento de Moçambique. A construção de infra-estruturas e a criação de oportunidades de emprego podem transformar a economia do País e melhorar as condições de vida das populações”, afirmou. Contudo, reforçou que, para que isso aconteça, o Governo deve garantir que haja transparência e inclusão na gestão desses recursos.

O papel de Moçambique na transição energética global

Wilker Dias também fez referência ao papel que Moçambique pode desempenhar na transição energética global. “A qualidade do gás que Moçambique oferece neste momento é um factor-chave para dinamizar o País no contexto internacional. O País pode tornar-se um líder na transição energética, não só por meio da exploração de gás, mas também ao focar-se em práticas sustentáveis que incluam energias renováveis”, afirmou.

No entanto, o docente sublinha que a implementação de políticas que garantam o desenvolvimento sustentável e a preservação dos direitos humanos deve ser uma prioridade. “Não basta que o País apenas se posicione como um exportador de recursos. É necessário que os benefícios sejam repartidos de forma justa, garantindo o desenvolvimento social e económico para as gerações futuras”, concluiu.

O académico também levantou a questão da concorrência internacional e dos potenciais desafios que podem surgir com a presença de múltiplos actores no projecto. “A presença de múltiplos financiadores pode ser positiva, pois reduz os riscos de dependência de um único investidor. No entanto, é importante garantir que todos os actores envolvidos estejam alinhados com os princípios de sustentabilidade e responsabilidade social”, disse.

Em última análise, Wilker Dias considera que a retoma do projecto Mozambique LNG oferece grandes oportunidades, mas que estas só serão plenamente aproveitadas se o Governo e as empresas envolvidas tomarem medidas concretas para garantir que as comunidades locais beneficiem, e que as questões de segurança, direitos humanos e desenvolvimento sustentável sejam priorizadas.

A retoma do Projecto Mozambique LNG representa, portanto, uma oportunidade de crescimento para o País, mas exige um cuidado especial com a segurança, os direitos humanos e o desenvolvimento sustentável das comunidades afectadas. A decisão do EXIM Bank abre portas para o futuro do projecto, mas também destaca a necessidade de uma abordagem estratégica para garantir que os benefícios se distribuam de forma equitativa e que o País possa superar os desafios para alcançar uma verdadeira estabilidade económica e social.

Texto: Nário Sixpene

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