
Entre rankings e verdade: a urgência da reforma universitária – José Esteves
Portugal precisa de se modernizar em todas as frentes — e o ensino superior não pode ser exceção. É curioso porquê muitos académicos discutem o horizonte da economia, da tecnologia e da geopolítica, mas evitam debater o sistema universitário onde trabalham. Talvez por receio, talvez por inércia. Mas reformar a universidade portuguesa não será mais difícil do que digitalizar o IRS — e isso já conseguimos.
A última tentativa de rever a Lei de Instrução evitou os verdadeiros bloqueios estruturais. Faltou anelo e sobrou cautela. Talvez sejamos nós que ainda não compreendemos a genialidade escondida por trás de programas com 20 cadeiras, 30 exames e uma boa ração de tradição.
Enquanto proclamamos superioridade, os Rankings internacionais de 2025 contam outra história. A maioria das universidades portuguesas caiu nas classificações do Times Higher Education (THE) e do Center for World University Rankings (CWUR). Com mais de 2.000 instituições avaliadas, as asiáticas sobem, as europeias recuam — e Portugal estagna. Os rankings não são perfeitos, mas quando todos apontam para febre… talvez valha a pena incumbir no termómetro.
A ciência pesa muito nos rankings internacionais: 59% no THE, 40% no CURA. Portugal, porém, continua a tropicar nos mesmos obstáculos: baixa produção científica, fraca taxa de citação, pouco financiamento competitivo. E o sistema está sobejo fragmentado: 97 instituições, 40 públicas — muitas sobejo pequenas e com escassa cooperação.
Espanha, com número semelhante, aposta na consolidação e em centros de superioridade com graduação e impacto. França, Finlândia e Alemanha fazem o mesmo. Em Portugal, continuamos presos à autonomia de cada escola — e à resistência à mudança.
O ensino precisa de reformas estruturais
Se a ciência está frágil, o ensino está em estado crítico. O THE aponta para a urgência de reformular pedagogias: programas atualizados, métodos modernos, alinhamento com o mercado de trabalho.
Muitos cursos ignoram o espírito de Bolonha. Persistem cargas horárias pesadas, aulas expositivas e exames extensos — um padrão pedagógico do século XX que está hoje desfasado da verdade. A pedagogia dominante continua a ser: o professor fala, o aluno copia, o PowerPoint repete, e no termo todos fingem que aprenderam. Uma coreografia muito ensaiada… desde 1973 (a reforma de Veiga Simão).
A perceptibilidade sintético está a transformar o ensino noutros países. Por cá, pouco mudou e o problema não é só pedagógico: o quadro legítimo exige que 75% dos docentes tenham doutoramento e pertençam à mesma unidade orgânica. Parece uma medida de qualidade, mas, na prática, bloqueia a ingresso de profissionais com experiência prática — um pouco que países porquê Alemanha, Países Baixos ou Reino Unificado já resolveram com modelos mais flexíveis para integrar especialistas da indústria, que trazem conhecimentos práticos altamente valorizados por alunos e empregadores.
Murado de 44% dos cursos em Portugal são mestrados — mas o país continua restringido a exclusivamente dois modelos oficiais: científico e profissionalizante. O primeiro multiplica-se com pouco impacto real na ciência e em publicações científicas. O segundo é uma anomalia que ninguém compreende.
Enquanto países porquê Espanha, França, Países Baixos ou Reino Unificado diversificaram a oferta com mestrados orientados para a prática profissional ou profissões liberais, Portugal mantém-se recluso a um padrão rígido e desatualizado.
Esta rigidez compromete a competitividade internacional, dificulta a captação de estudantes estrangeiros e restringe o reconhecimento solene necessário para bolsas, vistos e integração em redes académicas globais.
Internacionalização: um mito mal entendido
Portugal é frequentemente elogiado pela mobilidade académica no Erasmus, mas internacionalização não é sinónimo de estudantes felizes em festas Erasmus.
Recebemos mais do que enviamos — sem propinas, o balanço é mais afetivo do que financeiro. Para muitas instituições, representa um dispêndio suplementar sem retorno. Uma estratégia real exige atrair alunos internacionais para programas completos, com propinas, ensino em inglês, marketing direcionado e parcerias sólidas.
Também se culpam os baixos salários dos docentes, mas países com remunerações iguais ou inferiores — da Europa à América Latina — estão supra de nós nos rankings e a fazer inovação pedagógica. O bloqueio é estrutural, não financeiro.
O que não faz sentido é continuar a confrontar o ensino público português com universidades privadas porquê o MIT ou Stanford. Pretender recrutar professores desses contextos para instituições públicas soa mais a mito do que a projecto — e ignora limites éticos e estruturais claros. Para isso estão as universidades privadas com um padrão de negócio que propicia a sua contratação.
Anfibologia legítimo e estruturas paralelas
Um maravilha pouco discutido é a proliferação de estruturas paralelas — fundações, institutos ou centros ligados a universidades públicas — que operam num limbo legítimo. Servem para contornar regras de financiamento, salários e propinas.
Estas entidades criam zonas de opacidade, enfraquecem a transparência e dificultam a regulação. Pior: perpetuam lógicas endogâmicas e minam a crédito da sociedade.
Ao diluírem os limites entre o público e o privado, afastam investimento e comprometem a geração de um ecossistema competitivo. Sem regras claras, iguais para todos, não há reforma eficiente — e não há horizonte para um ensino superior moderno.
Uma economia baseada no conhecimento precisa de universidades com graduação, anelo e capacidade de competir globalmente. Os rankings de 2025 são mais do que um alerta — são um espelho.
Portugal já provou que consegue fazer mais com menos. É tempo de repensar a missão, a estrutura e os incentivos das instituições. Temos talento, história e resiliência. Falta alinhar meios com objetivos — e dar espaço à superioridade.