A inteligência artificial tanto pode agravar desigualdades como ajudar a saná-las, escreve o economista Daron Acemoglu. Agosto é o mês da juventude: que papel terá na nova vaga de inovação? Em tempos de viragem tecnológica e incertezas económicas, é oportuno destacar o nome de Daron Acemoglu na análise crítica sobre o papel da inteligência artificial (IA) no mundo do trabalho e na sociedade. Economista de renome e professor no Massachusetts Institute of Technology (MIT), Acemoglu tem dedicado grande parte dos seus estudos recentes a mostrar como o uso desenfreado e desregulado de IA pode aprofundar desigualdades económicas e sociais. Mas há um detalhe que escapa frequentemente aos debates: os jovens estão no centro desta revolução. De um lado, são os que mais dominam os códigos, as ferramentas e as linguagens da nova era digital. Do outro, são os mais vulneráveis ​​à precarização do trabalho e à exclusão tecnológica. Neste mês de Agosto, quando se assinala o Dia Internacional da Juventude (no dia 12), torna-se imperativo olhar para a IA como uma invenção de engenheiros e investidores, e como um espaço de disputa sobre o futuro da juventude, sobretudo nos países em desenvolvimento, como Moçambique. A visão de Acemoglu Daron Acemoglu alerta que a IA, tal como outras tecnologias, está a ser desenvolvida de forma concentrada, beneficiando um pequeno grupo de grandes empresas e elites técnicas. O resultado? Aumento das desigualdades salariais, polarização no mercado de trabalho e substituição de empregos de classe média por sistemas automatizados que não geram valor social relevante. Nos seus trabalhos mais recentes, como “Power and Progress” (em co-autoria com Simon Johnson), Acemoglu mostra que o progresso tecnológico só gera bem-estar colectivo quando há instituições inclusivas, senão, reforça assimetrias. A IA não é excepção: se for apenas usada para maximizar lucros e substituir pessoas será uma força destrutiva. Mas se for direccionada para complementar capacidades humanas, pode melhorar a produtividade, a saúde, a educação e abrir novas oportunidades. Juventude em risco, mas com potencial Em países com altas taxas de desemprego jovem como Moçambique, a IA pode parecer um luxo distante. Mas os seus efeitos já começam a ser sentidos, ainda que de forma indirecta: mudanças no ensino, pressões sobre o mercado informal, dependência de plataformas digitais, automação de sectores que antes ofereciam saídas para jovens sem qualificação formal. Se os algoritmos maximizarem lucros a qualquer custo, é provável que vejamos o crescimento de monopólios digitais, o aumento da vigilância e a erosão de empregos de qualidade Por outro lado, é também entre os jovens que vemos maior adaptação ao mundo digital: são eles que aprendem rapidamente a programar, a interagir com ferramentas como o ChatGPT, a empreender nas redes sociais ou a criar soluções tecnológicas com impacto local. Em Moçambique, jovens inovadores têm-se destacado em maratonas de programação e projectos de inclusão digital, como se viu recentemente em iniciativas como a GigaStart ou o desafio African Code Week. Este aparente paradoxo (juventude ameaçada, mas também protagonista) deve ser o ponto de partida para políticas públicas mais ousadas e para uma reflexão mais profunda sobre o papel da juventude na era da IA. Para onde vai a economia com IA? Acemoglu insiste que a questão central não é apenas tecnológica, mas económica e moral: como distribuir os ganhos da IA? Quem decide para que fins será usada? Se os algoritmos maximizarem lucros a qualquer custo, poderemos assistir ao crescimento de monopólios digitais, ao aumento da vigilância e à erosão de empregos de qualidade. Mas se forem pensados ​​como ferramentas para ampliar o bem-estar, podemos criar novas áreas de emprego, inclusive para jovens, em educação personalizada, saúde comunitária digitalizada, agricultura de precisão ou economia verde. Moçambique tem vantagens comparativas que podem ser aproveitadas se a juventude for colocada no centro da estratégia. O País tem uma população jovem (mais de 60% com menos de 25 anos), uma crescente penetração da Internet e uma diáspora digital emergente. O que falta são investimentos consistentes em formação técnica, ecossistemas de inovação inclusivos e políticas que incentivem a juventude a ser mais criadora do que apenas consumidora de tecnologia. Juventude moçambicana na vanguarda Existem já bons exemplos no País. Projectos de startups lideradas por jovens, plataformas digitais para educação e empreendedorismo e redes de partilha de conhecimento têm surgido mesmo com recursos escassos. O que estes exemplos mostram é que, com um mínimo de apoio e visão, a juventude pode transformar a IA num instrumento de inclusão e não de exclusão. Acemoglu não fala directamente de África em todos os seus textos, mas as suas ideias são relevantes para o continente. Ao insistir que a tecnologia precisa de ser moldada por decisões políticas e sociais, o economista está a dizer, indirectamente, que países como Moçambique não devem apenas consumir soluções externas. Devem participar na construção da IA ​​com os seus próprios valores e prioridades. BI Daron Acemoglu Daron Acemoglu nasceu a 3 de Setembro de 1967, em Istambul, Turquia. Formou-se em Economia Matemática com um bacharelato pela University of York, em 1989. Ao longo da carreira, distinguiu-se ao receber prémios como a Medalha John Bates Clark (2005), o Erwin Plein Nemmers (2012), o BBVA Frontiers of Knowledge (2016) e o Prémio Nobel de Economia (2024), partilhado com Simon Johnson e James A. Robinson, pelo trabalho sobre o papel das instituições no desenvolvimento económico. Actualmente, Acemoglu é professor no Elizabeth and James Killian no MIT e membro de várias academias pelo mundo. Texto: Celso Chambisso • Fotografia: DR

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