Cientistas da FinalSpark, uma empresa suíça de biotecnologia e computação, estão a construir o que chamam de “wetware” — computadores baseados não em chips de silício, mas em células cerebrais humanas vivas.
A startup, co-fundada pelo engenheiro de software Fred Jordan, faz parte de um esforço global crescente para criar biocomputadores capazes de aprender e adaptar-se como o cérebro humano, mas com uma fracção do custo energético.
Os sistemas tradicionais de Inteligência Artificial (IA), como o GPT-3, consomem uma enorme quantidade de energia, enquanto o cérebro humano consome cerca de 20 watts, aproximadamente o mesmo que uma lâmpada.
O investigador Fred Jordan acredita que a exploração da biologia pode oferecer uma alternativa mais eficiente e inteligente à computação convencional.
No interior do laboratório da FinalSpark, pratos do tamanho de chávenas de chá contêm minúsculos organóides esféricos. Estes neurónios respondem a sinais eléctricos, formando redes que podem aprender tarefas simples. “Vou usar um neurónio como uma pequena máquina”, disse Jordan, descrevendo como a empresa está efectivamente a treinar tecidos vivos para computação.
“Estamos a considerar isto como uma máquina, mas provavelmente é um erro”, disse o engenheiro
De acordo com o portal Zap Aeiou, a ideia não é totalmente nova. Em 2022, o Cortical Labs da Austrália fez manchetes quando uma cultura de neurónios aprendeu a jogar Pong após apenas alguns minutos de treino, numa experiência chamada DishBrain. Ambos os projectos sugerem que os sistemas biológicos poderão em breve superar o hardware digital em flexibilidade e adaptabilidade.
No entanto, a tecnologia levanta profundas questões éticas e filosóficas. Os organóides utilizados pelo FinalSpark estão vivos e, embora minúsculos, crescem, ligam-se e até exibem breves surtos de actividade eléctrica semelhante à cerebral antes de morrerem. Jordan afirma que a sua equipa registou até 2000 “mortes” de aglomerados de neurónios, algumas precedidas por misteriosos picos eléctricos semelhantes aos observados em cérebros humanos moribundos. “Estamos a considerar isto como uma máquina, mas provavelmente é um erro”, disse o engenheiro.
Em resposta a estas preocupações, investigadores de todo o mundo assinaram a Declaração de Baltimore sobre a Inteligência de Organóides em 2023, exigindo padrões éticos em relação à senciência, consentimento e potencial sofrimento nos sistemas computacionais vivos.
Enquanto a FinalSpark se concentra em organóides 3D, a Cortical Labs procura redes de neurónios 2D, que sejam mais fáceis de ligar e escalar. A empresa planeia lançar uma plataforma “Wetware-as-a-Service”, permitindo aos cientistas experimentar remotamente culturas neurais vivas.
Por enquanto, estes sistemas são primitivos, sendo mais próximos do cérebro de uma mosca-da-fruta do que do de um humano, mas estão a aprender rapidamente. Com os biocomputadores da FinalSpark a funcionar 24 horas por dia, 7 dias por semana, nas universidades parceiras, a era das máquinas vivas e pensantes pode estar mais próxima do que se imaginava.