
As Lições de Veblen • Diário Económico
Thorstein Veblen é reconhecido como um dos economistas mais provocadores do final do século XIX. As teorias sobre o comportamento humano, a relação entre economia e cultura e a crítica às instituições capitalistas tiveram um profundo impacto no pensamento económico.
Thorstein Veblen, economista e sociólogo americano de ascendência norueguesa, destacou-se por unir perspectivas económicas, antropológicas e sociológicas. A abordagem interdisciplinar e a crítica contundente à procura desenfreada por estatuto e consumo excessivo são ainda hoje aplicáveis, orientando reflexões sobre desigualdade social e sustentabilidade económica.a d v e r t i s e m e n t
Veblen é mais conhecido pela obra-prima The Theory of the Leisure Class (A Teoria da Classe Ociosa), de 1899, onde introduziu conceitos como “consumo conspícuo” e “ociosidade conspícua”. O economista desafiou o pensamento económico ortodoxo ao questionar o comportamento das classes sociais num sistema capitalista, enfatizando que a economia não é apenas uma ciência matemática, mas também social e cultural.
O reconhecimento de Veblen reside na capacidade de questionar a ideia de que o mercado opera de forma eficiente e de que os agentes económicos são sempre racionais. Em vez disso, Veblen argumentou que o comportamento económico é influenciado por factores culturais, psicológicos e sociais, uma visão que precedeu e influenciou a economia comportamental moderna.
“Consumo conspícuo”
No centro da obra de Veblen está o conceito de “consumo conspícuo”, que descreve como as classes abastadas ostentam riqueza e estatuto através de gastos e actividades luxuosas. Para Veblen, tal não era apenas uma forma de satisfazer necessidades, mas também um mecanismo para estabelecer distinção social. Trata-se de um comportamento, segundo o economista, que contribui para perpetuar desigualdades e para um desperdício de recursos, fruto de economias baseadas na aparência.
No centro da obra de Veblen está o conceito de “consumo conspícuo”, que descreve como as classes abastadas ostentam riqueza e estatuto através de gastos e actividades luxuosas
Outra contribuição importante do autor é a ideia de “ociosidade conspícua”, que reflecte a prática de evitar trabalhos considerados vulgares para demonstrar ‘status’ social elevado. Tal noção liga-se ao “consumo conspícuo”, enfatizando como a procura pelo prestígio molda decisões económicas.
A “classe ociosa”
Veblen também introduziu o termo “classe ociosa” para descrever os grupos privilegiados que, ao controlar recursos sem participar directamente na produção, exercem um papel desproporcional na economia. O economista e sociólogo criticava a forma como as instituições económicas perpetuavam tais dinâmicas, muitas vezes ineficazes e socialmente prejudiciais.
Instinto e inovação
Veblen desafiou a visão de que os indivíduos tomam decisões económicas exclusivamente racionais. Argumentava que instintos básicos — como os de trabalho e de emulação — influenciam as escolhas humanas. Ao mesmo tempo, via a tecnologia como uma força transformadora capaz de mudar as instituições e os comportamentos sociais.
Aplicabilidade das teorias de Veblen
Embora muitas das ideias tenham sido desenvolvidas há mais de um século, a sua relevância persiste em várias áreas, nomeadamente:
• Estudos de consumo e marketing – empresas e analistas de mercado utilizam a noção de consumo conspícuo para compreender como o desejo por estatuto molda o comportamento do consumidor. O comércio de produtos de luxo, como carros desportivos e moda de marcas prestigiadas, baseiam-se frequentemente naquela lógica.
• Sustentabilidade e economia verde – a crítica de Veblen ao desperdício é aplicável às discussões modernas sobre consumo sustentável. Movimentos a favor da economia circular e da redução do consumo excessivo encontram reflexo na sua obra.
• Economia comportamental – pesquisas contemporâneas, como as de Daniel Kahneman e Richard Thaler, ecoam a crítica de Veblen à racionalidade económica. Estudos que analisam vieses cognitivos e decisões irracionais estão alinhados com a sua ênfase na influência de factores sociais e culturais.
• Análise de desigualdades – académicos que estudam desigualdades, como Thomas Piketty, consideram conceitos ‘veblenianos’ ao explorar como o capital e a riqueza são usados para perpetuar hierarquias sociais.
• Críticas ao capitalismo – movimentos que questionam as práticas corporativas e a concentração de poder económico inspiram-se frequentemente nas críticas de Veblen às instituições económicas.
Ostentação de riqueza ou dos focos nos estudos Veblen
Críticas ao pensamento de Veblen
Apesar de reconhecidas como relevantes, algumas das ideias de Veblen foram consideradas vagas ou excessivamente pessimistas. A visão de classes impulsionadas exclusivamente por motivações egoístas foi acusada de subestimar a complexidade do comportamento humano. Além disso, os críticos indicam que Veblen falhou em oferecer soluções práticas para os problemas que diagnosticou.
Outros questionam a abordagem interdisciplinar, argumentando que diluiu o rigor teórico típico da economia convencional. A sua escrita irónica também dificultou a popularização imediata das ideias que defendia.
O Legado Duradouro de Thorstein Veblen
Thorstein Veblen permanece como figura de referência para economistas, sociólogos e estudiosos de diversas disciplinas. A crítica à sociedade de consumo, à desigualdade e às instituições económicas oferece considerações valiosas num mundo que enfrenta problemas como as mudanças climáticas, concentração de riqueza e crises financeiras.
Mais do que um teórico da economia, Veblen foi um crítico social que incentivou uma abordagem mais holística e ética para compreender a economia.
Texto: Celso Chambisso • Fotografia: D.Ra d v e r t i s e m e n t